sexta-feira, 8 de janeiro de 2010

O casamento do Dr. Diogo Freitas do Amaral

No artigo publicado na revista Visão nº879, nas páginas 38 e 39, o Dr. Diogo Freitas do Amaral esclarece-nos sobre o que é o casamento. Começa muito bem ao dizer que "o facto de a qualificação das uniões homossexuais como «casamento» não existir senão numa escassa dezena de países(...) devia levar-nos a meditar sobre se estamos perante o início de uma evolução irreversível, ou apenas diante de uma moda passageira". Estou de acordo, embora tenha quase a certeza que depois do mesmo tempo de meditação, chegaremos a conclusões diferentes.
Um pouco mais à frente no artigo tenta reforçar o peso do casamento como associado exclusivamente à união de pessoas de sexos opostos, usando a idade como argumento. Não a sua idade, mas a idade do casamento heterossexual: há registos escritos da instituição casamento (heterossexual e monogâmico) desde há mais de cinco mil anos, idade da primeira civilização conhecida (a Suméria). (Não que seja de muita importância, mas as fontes do Dr. Amaral não estão de acordo com as minhas, segundo as quais o homo sapiens existe na região euro-mediterrânica há mais de quarenta mil anos, em oposição com os dez mil anos sustentados pelo Dr. Amaral.) Parece-me que o argumento é: o facto de existir desde sempre, desequilibra a balança para o lado da sua manutenção. O que dizer então da escravatura, cujos registos vão também até à civilização Suméria? Não posso garantir, mas aposto que na altura da sua abolição houve pessoas a esgrimir este mesmo argumento. Estavam certas? Não. Logo, o argumento não é válido.
Diz-nos também o Dr. Amaral que o regime jurídico do casamento “tem sobretudo em vista impor aos pais deveres sérios em relação aos filhos”, deveres esses que devem contribuir para “a sobrevivência da espécie humana”. Em troca desses deveres, o estado garante aos pais alguns direitos. O ser humano nasce indefeso, e precisa de protecção durante os primeiros anos de vida, protecção essa que os pais ficam obrigados a dar aos filhos, quando estão casados. Dito isto, o Dr. Amaral faz um salto de lógica assombroso: as uniões familiares homossexuais “não são idênticas à instituição do «casamento» enquanto tal: não são geradoras de descendência própria nem precisam, portanto, dos direitos de deveres dos pais em relação aos filhos”. Ora, umas linhas atrás o Dr. Amaral diz: “todos sabemos que pode haver procriação sem casamento, assim como casamento sem procriação”. Estou confuso: por um lado existe casamento sem procriação, por outro lado as uniões familiares homossexuais não devem ser consideradas casamento porque não geram descendência... Para além disso, com que direito insinua o Dr. Amaral que o facto de os pais não serem de sexos opostos impossibilita ou prejudica a protecção dos filhos (biológicos ou adoptados)?
No penúltimo parágrafo do artigo o Dr. Amaral tenta usar mais um argumento no mínimo estranho: “se a legalização do «casamento» entre homossexuais é, como se proclama, um factor decisivo de progressismo e modernidade, porque é que ela não foi até hoje aceite, com o nome «casamento», nas grandes democracias europeias”? (ênfase minha). Nem sequer vou comentar.

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